terça-feira, 22 de dezembro de 2015

A NOITE DO CÃO

"Mesmo estando em um local deserto com o silêncio da noite, devemos sempre estar alertas, porque mesmo com a aparente solidão, podemos estar sendo observados, e o resultado pode não ser muito agradável!"




Foi no final da década de setenta, durante uma madrugada gélida (fato comum aqui no Rio Grande do Sul), que esse fato ocorreu comigo, e me marcou muito!

Na época eu era funcionário do Estado e algumas vezes permanecia trabalhando durante a noite inteira.
Numa dessas noites, um colega que havia terminado sua jornada solicitou uma carona até em casa.
Ele residia num bairro distante do local onde ficava localizada a repartição.
Quando retornei já era madrugada alta, e fui colocar o veículo em um estacionamento onde os lugares eram demarcados.
O tal estacionamento ficava localizado num vasto terreno circundado por uma cerca de zinco.
Internamente ele possuía como divisor físico um tapume de madeira, separando assim as duas áreas, o estacionamento (onde eu estava) e uma outra utilizada para serviços diversos.
O tapume de madeira não cobria todo o espaço, ficando a uns trinta centímetros do solo, assim, quem estivesse no estacionamento poderia ver os pés de quem estava no outro lado e vice e versa.
Então entrei com o carro, desliguei o motor e desci.
Tão logo iniciei o meu caminho até a saída, senti nitidamente que estava sendo observado.
Na parte que eu havia deixado o carro a lâmpada do poste estava queimada, sendo que era necessário avançar mais trinta metros para atingir uma outra parte iluminada do terreno.
Instintivamente olhei para o tapume divisório, percebendo que alguém caminhava no mesmo sentido que eu, porém do lado oposto.
Estranhei a "companhia", pelo certo não deveria haver ninguém na área desativada pelo horário tardio.
Intrigado e já ficando nervoso, diminui a minha passada, esperando que o visitante cruzasse pelo poste iluminado antes de mim, para que eu pudesse saber "de quem se tratava".
Quando estanquei a passada "ele" estancou também do outro lado.
Reiniciei a andar, mas confesso que agora já estava ficando perturbado pelo acompanhamento anônimo.
Na parte central do estacionamento o tapume sofria uma falha de continuidade.
Casualmente nesse vão existente, a iluminação era razoavelmente boa, e ali certamente eu veria o intruso de corpo inteiro.
Conforme fomos "nos" aproximando da luz, percebi de relance (eu não voltava a cabeça diretamente, apenas espiava, pois "ele" tinha o cuidado de caminhar dois passos atrás, ou seja, nunca ficamos lado a lado, pois parecia me espreitar) que não eram pés humanos e sim patas de um animal canino.
Estranhei o comportamento daquele bicho, parecia racional demais, não se apresentava em minha frente nunca, caminhava silenciosamente, se ocultando nas sombras e quase no mesmo ritmo do meu passo.
Finalmente cheguei no ponto mais iluminado onde existia o vão no tapume. Virei o pescoço e fiquei aguardando "ele" surgir.
A primeira coisa que vi realmente foram dois olhos vermelhos faiscantes em minha direção.
Sei que os olhos dos caninos e felinos brilham na noite, mas "aqueles" brilhavam com uma intensidade perturbadora.
Senti um frio correr pela espinha e uma sensação desconfortável de medo.
Era um cão incrivelmente negro, grande sem ser descomunal, e os olhos faiscantes ficavam "colados" em mim o tempo inteiro, parecia adivinhar meus pensamentos.
Ficou me acompanhando pelo outro lado do tapume (uns cinco metros) e mesmo com o vão existente que possibilitava a entrada dele no estacionamento ele não o fez, e continuou "me escoltando" sempre alguns passos atrás, e quando eu olhava em sua direção eu ficava ofuscado pelo intenso brilho daqueles olhos impressionantes.
Mesmo quando saí do estacionamento e atravessei uma rua em direção do meu local de trabalho não tive coragem de olhar para trás, pois "sentia" ainda seus olhos sobre mim.
Depois daquela noite, fiquei pensando sobre o caso, e lembrei que naquelas cercanias não havia residência alguma, pois eu conhecia bem aquela região.
De onde teria surgido e o que na verdade seria aquele cão negro de comportamento tão intrigante que me acompanhou e me observou por todo o meu trajeto?

Sei que jamais saberei, mas aprendi que neste mundo nunca realmente estamos sós. 

Sem comentários:

Enviar um comentário