Logo que entrei na Ordem Rosacruz – Amorc, conheci um Frater (tratamento que os Rosacruzes se dão – Frater, Irmão – Soror, Irmã). Estávamos na década de oitenta, eu no auge dos meus vinte e cinco anos, e o Frater já próximo dos sessenta. A inflação era muito alta naquela época. Ele era comerciante e tinha como lema, vender mais barato, para vender mais. Seu estabelecimento comercial estava sempre lotado. Vinham pessoas de outras cidades para comprar nele. Este Frater já passou pela Grande Iniciação.
Um dia quando estávamos no Organismo Afiliado, logo após uma Convocação (reunião semanal dos Rosacruzes, com um tema para meditação), ele me chamou para um canto isolado e me disse, o que considerei um verso poético.
'Ouvi a Palavra sussurrada
Vi o Sol dos Rosacruzes
Recebi um novo nome
E fui abençoado'.
Passei anos sem esquecer o pequeno poema, mas também sem entender nada a respeito.
Bem mais tarde, entendi o primeiro verso.
Quanto ao segundo, livros como Misticismo, de Evelyn Underhill, em sua segunda parte, Capítulo IV, páginas 385-409 e Consciência Cósmica, de Richard Maurice Bucke, este nas descrições que faz ao longo do livro, ajudam a entender.
Seria a luz que estes livros relatam que o Frater tinha visto?
A luz que Dante viu no Paraíso (Paraíso I, 61-63; XXX, 100-102 e XXXIII, 90-102)?
Ou teria visto, na noite terrestre, o seu luminoso Duplo, sua alma celeste, seu Guia Divino (citando o Livro dos Mortos, Hermes, Livro III, Os Grandes iniciados, Édouard Schuré); seu ser luminoso, sua alma, seu sublime Augoeides (Segundo Livro, Capítulo IV, página 140, Zanoni)?
Quem o sabe?
Quanto ao terceiro verso, o Novo Nome, provavelmente estaria se cumprindo Apocalipse II, 17 e tratar-se-ia de uma Iniciação (ver verbete Pedra Branca, no Glossário Teosófico).
Mas que Iniciação? Uma Iniciação Psíquica? Conduzida por quem? Até hoje não tenho a resposta.
Quanto ao quarto e último verso, quando o Frater refere-se a uma benção, só consigo me lembrar das bênçãos bíblicas, dadas por exemplo, por Moisés aos israelitas (Deuteronômio 33) e por Iahweh e Melquisedeque a Abraão (Gênesis 12, 1-3 e 14, 17-20).
Será que é a uma benção similar a esta, embora de menor magnitude, que o Frater se refere? Mas, dada por quem?
Sem dúvida o Caminho (Senda) Rosacruz é longo e cheio de surpresas místicas, penso no instante em que escrevo este artigo.
Como o Frater transmitiu para mim, agora transmito a vocês. Mais uma vez, temas profundos do universo Iniciático e da Alquimia, parecem se confundir, pois objetivos similares, bem como resultados idênticos, se associam.
Assim é com a Estrela da Iniciação, que é vista quando da entrada em Consciência Cósmica, e com a Estrela que o Alquimista conquista ou toma posse, em seu laboratório.
Da primeira nos falam Édouard Schuré, em Orfeu, Os Grandes Iniciados e Max Heindel, no capítulo Cristo e sua missão, em Conceito Rosacruz do Cósmico. Da segunda nos fala Fulcanelli, em O Homem da Floresta, capítulo de As Moradas dos Filósofos.
Édouard Schuré explica que era noite de lua cheia, consagrada aos Mistérios de Dionisos.
Em dado momento, os Iniciandos viam o Sol clarear o vale, e Orfeu fala:
“Saúdo-vos a todos que viestes para renascerem depois dos sofrimentos da terra, e que renasceis agora. Vinde beber a luz do Templo, vós que sais da noite, mistos, mulheres, iniciados. Vós que chorastes, vinde alegrar-vos. Vós que lutastes, vinde repousar.
Evoco o Sol sobre vossas cabeças. Ele vai brilhar em vossas almas. Não é o Sol dos mortos. É a pura luz de Dionisos, o grande Sol dos Iniciados”.
E, Max Heindel, explica:
“Por tal motivo, os discípulos preparados para a Iniciação eram, pelas mãos dos Hierofantes dos Mistérios e por meio de cerimônias que se realizavam no Templo, elevados a um estado de exaltação no qual transcendiam as condições físicas.
À sua visão espiritual, a Terra sólida tornava-se transparente. Então eles viam o Sol da Meia-Noite: a Estrela. Não era, porém, o sol físico aquilo que viam com os seus olhos espirituais, mas o Espírito do Sol – o Cristo – seu Salvador Espiritual, assim como o sol físico era seu Salvador físico”.
E, finalmente, para mim abordando tema semelhante, ou seja, a Iniciação ou a entrada em Consciência Cósmica, Fulcanelli ensina:
“Eis o primeiro segredo, aquele que os filósofos não revelam e que guardam sob a enigmática expressão do caminho de São Tiago.
Essa peregrinação, todos os Alquimistas devem fazer. Pelo menos figurativamente, pois é uma jornada simbólica e, quem quiser ganhar algo dela, não pode sair do laboratório nem por um instante. Deve observar constantemente o vaso, a matéria e o fogo. Deve ficar dia e noite ao lado da Obra.
Compostela, cidade emblemática, não fica em território espanhol, mas na própria terra do sujeito filosófico. Estrada difícil, dolorosa, cheia de surpresas e perigos. Estrada longa e cansativa, pela qual o potencial se realiza e o oculto se manifesta! Os sábios esconderam essa delicada preparação da primeira matéria ou mercúrio comum sob a alegoria da peregrinação à cidade de Compostela.
Nosso mercúrio, cremos já ter mencionado, é esse peregrino, esse viajante a quem Michel Maier consagrou um dos seus melhores Tratados! Usando o caminho seco, representado pela estrada terrestre seguida a princípio por nosso viajante, pode-se com sucesso, porém progressivamente, exaltar e difundir a virtude latente, transformando em atividade aquilo que era apenas potencial.
A operação se completa quando, na superfície, aparece uma Estrela brilhante, formada de raios emanando de um único centro, protótipo das grandes rosas de nossas catedrais góticas. Um sinal certo de que o peregrino conseguiu chegar ao término de sua primeira viagem. Ele recebeu a benção mística de São Tiago, confirmada pela impressão luminosa que radiava, diz-se, acima da tumba do Apóstolo.
A concha humilde e comum que ele carregava no chapéu se converteu em uma Estrela brilhante, um halo de luz. Matéria pura cuja estrela hermética consagra a perfeição: agora é o nosso composto, a água benta de Compostela (do latim compos, aquele que recebeu, que possui – e stella, estrela) e o alabastro dos sábios (albastrum, contração de alabastrum, estrela branca). É também o vaso de perfumes, o vaso de alabastro (do grego – alabastron, ou latim, albastrus), o botão recém-aberto da flor da sabedoria, a rosa hermética”.
No Glossário Teosófico, sob o verbete Iniciação, Annie Besant fala da existência de Quatro Graus de Iniciação Psíquica, e para mim, estamos diante de um deles.
Outro belo nome para esta Iniciação seria “O Sol dos Rosacruzes”, que aguarda o Estudante sincero, pois para os Mestres não existe tempo ou espaço.
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