Segundo um folclore japonês, o responsável pelos terremotos é um bagre gigante chamado Namazu ou Namazu-e (o segundo termo refere-se às xilogravuras de Namazu) que vivem em tocas subterrâneas. Namazu é considerado um yo-kai (que pode se traduzir como “monstro”), ou seja, uma criatura do folclore ou mitologia japonesa que estão associados à desgraças e/ou desastres.
O Namazu, segundo a lenda japonesa, ao mover a sua cauda, é capaz de tremer todo o planeta, causando muitos estragos. Antes dele, os terremotos sempre foram associados à movimentos de divindades ou criaturas que moram embaixo das ilhas japonesas, como dragões ou serpentes. Com o passar do tempo, o Namazu foi substituindo essas criaturas e divindades no imaginário popular.
As xilogravuras (ukiyo-e) eram famosas no Japão entre os séculos 17 e 19 e Namazu foi tema de diversas delas. Em muitas gravuras, ele aparecia como metáfora da redistribuição de renda, uma vez que, após um terremoto, os mais abastados dividiam sua riqueza com os pobres para a reconstrução do local onde viviam.
Namazu sendo atacado: Esta xilogravura
mostra Namazu sendo atacado pelos cidadãos do Período Edo, depois
do Grande Terremoto Ansei.
Quando um Grande terremoto Ansei atingiu Tóquio, em novembro de 1855, matando mais de 7 mil pessoas e causando uma grande destruição, a responsabilidade pelo desastre foi atribuída ao bagre gigante, como de costume. Neste período, as xilogravuras Namazu-e (ukiyo-e) se popularizaram rapidamente e em poucas semanas, já eram mais de 400 tipos disponíveis.
A popularidade do Namazu-e foi sobretudo uma resposta ao terremoto Edo e tentavam retratar os “aspectos positivos” como a redistribuição da riqueza, além de ser uma maneira de levantar a moral dos sobreviventes, que acreditavam que ao andar como um Namazu-e, estariam protegidos contra outros terremotos.
Terremotos, trovões, fogos e pais: Este
ukiyo-e também faz referência ao japonês velho ditado, “As coisas mais
assustadoras são terremotos, trovões, fogos e pais.” Aqui, um namazu e
os deuses do trovão e fogo discutem seus poderes durante um banquete,
enquanto são observados pelo pai.
Namazu também foi usado como forma de satirizar a aristocracia japonesa e por causa disso, dois meses depois, o governo de Tokugawa, que mantinha um rígido sistema de censura sobre a indústria editorial, proibiu a produção das xilogravuras. Hoje existem muito poucos originais dessas xilogravuras Namazu-e.
Vítimas do terremoto vingam-se do bagre
gigante responsável pela destruição: Nesta xilogravura, Namazu, que
representa o terremoto de Edo (atual Tóquio), em outubro de 1855, é
atacado por camponeses e concubinas.
Segundo a lenda, o terremoto de Edo, coincidiu com o “mês sem deuses”, onde se acredita ser um período em que todos os deuses se reúnem em um templo secreto. Aproveitando-se da ausência de Kashima, o covarde Namazu causou destruição e sofrimentos no mundo humano.
Namazu e a rocha kaname-ishi: O único que
consegue dominar a fera Namazu é o deus Kashima, usando uma grande rocha
conhecida como kaname-ishi (Pedra fundamental). Porém, certa vez
Kashima saiu da cidade, deixando Ebisu (deus da pesca e comércio) no
comando.
Durante sua vigília, ele acabou dormindo, dando a deixa para Namazu escapar. As moedas de ouro que caem do céu nesta xilogravura, simbolizam a redistribuição da riqueza durante a fase de reconstrução. Só não me perguntem porque Raijin, deus do trovão, do lado esquerdo da gravura, está defecando… Será que vem daí o bordão “Tô cagando e andando”?
Cabo-de-guerra entre namazu e o deus
Kashima: Esta xilogravura mostra uma espécie de cabo de guerra” e Namazu
com o deus Kashima. Do lado de Kashima, vemos as vítimas do terremoto,
enquanto ao lado do bagre gigante, estão aqueles que normalmente lucram
com os terremotos (trabalhadores da construção civil, bombeiros,
editores de notícias, etc).
O primeiro Namazu-e: Produzido dois dias
após o terremoto, este trabalho dos artistas Kyosai Kawanabe e Kanagaki
Robun é considerada o primeiro namazu-e, e faz referência ao Teatro
Kabuki, muito popular na época, inspirou a criação de muitos outros
namazu-e que vieram posteriormente.
Método mágico de proteção terremoto: Este
Namazu-e mostra um momento de redenção por parte dos Namazu, que é
quando um grupo deles se curvam diante do deus Kashima, se desculpando
pelas destruições que causaram enquanto ele estava fora.
Família Namazu: Esta xilogravura mostra uma multidão de vítimas do terremoto que vêm para se vingar de um namazu e seus filhos.
Para a paz e tranquilidade: O deus Kashima
e prostitutas do distrito da luz vermelha Yoshiwara, expressam sua
raiva contra o bagre responsável por terremotos. Segundo o folclore
japonês, esta xilogravura oferece proteção contra terremotos.
Namazu salvadores: Nem todas as
xilogravuras expressam negativamente os Namazu. Algumas xilogravuras
como essa de cima, mostram o lado benevolente de namazu, onde eles são
vistos resgatando pessoas dos escombros.
Namazu é apunhalado pelo deus kashima:
Nesta xilogravura, Namazu é colocado sobre uma mesa gigante, após ser
apunhalado na garganta pelo deus Kashima. A multidão está dividida em
dois grupos. As pessoas na metade superior da imagem são rotuladas como
“sorridentes” (aqueles que se beneficiam com o terremoto) e as pessoas
no fundo são rotulados como “chorões” (aqueles que são prejudicados pelo
terremoto).
O grupo superior inclui um carpinteiro, um
estucador, vendedor de madeira, um ferreiro, uma cortesã de elite, uma
prostituta, um médico e um agricultor. O grupo inferior inclui o dono de
uma casa de chá, um vendedor de enguia, artistas diversos, tais como
músicos, comediantes e contadores de histórias, um vendedor de produtos
importados de luxo e um vendedor de diamantes.
Deus Kashima apreende o Namazu, usando a rocha kaname-ishi
O terremoto e um milhão de “orações”: Esta
xilogravura, mostra bem o outro lado da moeda. Namazu, sentado em um
rosário gigante, não deseja mais causar terremotos algum, porém,
“adoradores” (comerciantes, como madeireiros e carpinteiros que lucram
com o desastre) estão orando para ele agir novamente. Na parte superior
da imagem, estão os fantasmas das milhares de vítimas perdidas por causa
do terremoto.
Segundo o folclore japonês, a lenda sobre o
Namazu tem várias versões. Em algumas delas, ao invés do Kaname-ishi,
deus Kashima usa espada ou até um tipo de abóbora mágica para imobilizar
o gigante causador de terremotos.
Há também muitas formas para interpretar a
lenda, para uns, Namazu possui uma imagem destruidora, enquanto que
para outros, ele representa proteção ou simplesmente um elemento de
crítica social.
Entretanto, a imagem do Namazu a partir do
período Edo (1603-1867) até os dias de hoje, é mais positiva no geral,
sendo hoje associado a um período de grandes mudanças ou como alerta de
que uma catástrofe está para acontecer.
Hoje em dia, os Namazus são muitas vezes
representados como amuletos da sorte referentes à prevenção de
catástrofes naturais, onde o Namazu aparece ilustrado de uma forma mais
simpática. Muito interessante esses personagens do folclore japonês, não
acham?
Sem comentários:
Enviar um comentário